sexta-feira, 4 de março de 2011

Ainda há tempo para ser feliz- CAPTS, I , II, e III

CAP I

Dóris sabia que estava certa. Sua vida mudara da água para o vinho, literalmente quando conhecera Heitor. Seus familiares e vizinhos não eram mais os mesmos, desde então. Não que ele fosse algum marginal, viciado ou coisa parecida. Era apenas bem diferente das pessoas de seu mundo suburbano...
Heitor gostava de chocar, demostrava logo com uma coisa que hoje em dia, é como se fosse uma verdadeira bomba, jogada sobre as pessoas: Era ateu.
Isso já fazia com que o mundo se virasse contra ele, ainda mais uma família onde todos tinham religião, como a de Dóris:
Alguns eram católicos, outros evangélicos, outros, espíritas.
Já por esse motivo ele desagradava, além disso, gostava de Heavy Metal, e quando estava em casa, ouvia altíssimo. Desagradando seus vizinhos. Também gostava de chocar com o que vestia: Cortava as beiradas das camisetas, escrevia frases que a maioria das pessoas não gostaria de ler, como:
"VÃO SE F...!"
As calças jeans, viravam bermudas esfiapadas e frequentemente fazia furos largos, dando um jeito de parecer surradas.
Mas nem sempre era assim: Quando saíam para outros lugares ele se vestia adequadamente. Na verdade, Dóris desconfiava que ele tivesse dupla personalidade ou transtorno bipolar.
Ainda assim, ela estava completamente apaixonada por ele. Já havia se acostumado com o jeito de ser dele, e a mudança brusca de atitude o tempo todo. Tinha momentos que parecia um adolescente roqueiro, em outros, um velho, quando escutava música clássica...
Mas com ele Dóris se sentia viva! Isso era o mais importante para ela. Sua vida com o falecido marido, tinha sido muito trabalhosa, embora o tivesse amado muito.
Ele estivera doente por mais de 15 anos. Casara cedo, adolescente ainda, sua vida se resumiu a partir daí, em cuidar de marido, filhos e negócio próprio. Seus passeios quando o falecido ainda estava bem de saúde, eram apenas em churrascarias e shoppings. Nas férias dos filhos e feriadões viajavam para a Bahia e Minas Gerais, e nada mais que isso!Já com Heitor, ela conheceu lugares que nunca tinha ido, mesmo nascida e criada na Cidade Maravilhosa, como as feiras de fim de semana no centro do Rio...
Era um ritmo de vida diferente agora, novas coisas foram agregadas ao seu cotidiano desde que decidiram ficar juntos.A família de Dóris não gostava do jeito dele e por esse motivo não o queriam por perto. Ela muitas vezes se sentia excluída, não ia mais aos almoços familiares porque se não fosse com ele, preferia ficar em casa!
Um dia teriam de aceitar seu novo marido como parte integrante da família, aí ela voltaria aos almoços de confraternização.Ficava danada da vida, porque tudo se falava por "debaixo dos panos", nunca diretamente para ela, e quando houve um almoço na casa de sua filha do meio, onde Dóris compareceu, (Heitor ficou em casa, porque sabia que não era desejado na casa do genro de Dóris também) o assunto veio à tona, finalmente...
À mesa estavam seus familiares conversando sobre diversos assuntos, até que sua mãe disse:
_ Dóris por que você não vai mais aos almoços lá em casa? Está se afastando da família?
Ela sentiu o rosto esquentar, era uma filha que sempre teve muito respeito pelos pais, mas sua mãe muitas vezes era 'sem noção'. Falar desse assunto até então evitado, assim, na frente de todos...
TERIA DE CONTORNAR A SITUAÇÃO, DAR UMA DESCULPA QUALQUER, MUITO EMBORA QUISESSE DIZER ALI, PARA TODOS OUVIREM EM ALTO E BOM SOM:"COMO QUEREM QUE EU VÁ, SE VOCÊS NÃO CONVIDAM E NEM ACEITAM MEU NOVO MARIDO? SEM ELE EU NÃO VOU A LUGAR ALGUM!
Dóris respirou fundo, sabia que todos estavam olhando para ela, aguardando a resposta:
_ Qualquer hora eu vou, quem sabe no dia das mães? E não estou me afastando de ninguém, apenas tenho um novo modo de vida, que vocês ainda não entendem, apenas isso...
A conversa parou aí. Todos voltavam a comer e a sobremesa foi servida:
Um sorvete de milho verde, que sua mãe fazia sempre e que Dóris amava, deu um gelo final no assunto em questão.
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Heitor e Dóris estavam apaixonados, e falassem o que quisessem os parentes e vizinhos, nada iria mudar isso!
Com ele, Dóris dançava, cantava...
Algumas vezes, em dias de sábado, iam até o centro do Rio, e depois que as lojas fechavam, saíam cantando e dançando em meio aos prédios e ruas.Faziam muitas caminhadas também na restinga e pelas praias semi virgens (porque aos poucos estavam sendo descobertas por vários grupos, nos fins de semana)...
Heitor acordava Dóris, com o café na cama, algumas vezes com flores colhidas bem cedinho lá na restinga. Tinham uma vida sexual ativa, que para ambos era super importante isso, pois constituía 90% do bom relacionamento entre eles. Os outros 10%, cabiam a convivência e tolerância.

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CAP II

A vida não andava bem, financeiramente, para Dóris e Heitor. Ele trabalhava por conta própria, porque mesmo formado em publicidade, não estava empregado mais, e ali para onde se mudaram, as coisas eram muito mais difíceis do que no Rio. Não havia muita expectativa de melhoria. E Dóris como pensionista do primeiro marido, basicamente punha todo o dinheiro nas contas... Para piorar a situação o aluguel era bem maior do que na casa anterior, as despesas aumentaram consideravelmente...
No fim do mês era só agonia, contando os dias para virar o mês e ter seu pagamento no banco.Muitas vezes quando sua filha caçula estava na casa de seus parentes, ela e Heitor comiam racionadamente para dar até a última semana do mês.
Sua família nem poderia imaginar tal coisa, porque aí sim, caíriam "na pele" dela direto, por estar com ele. Mas o que eles não pensavam era que ela se sentia feliz e bem, na companhia dele, e isso para ela, valia qualquer sacrifício...
Além do mais, Dóris adotou uma maneira de viver de nunca se meter na vida de ninguém, para que não desse o mesmo direito aos parentes.
Passara tantos anos apenas servindo de enfermeira para o primeiro marido, das clínicas e hospitais para casa, merecia agora ter esse novo amor, que eles não se intrometessem e a deixassem vivenciar isso!

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Eles se viravam para aumentar a renda, ele andava pelos antiquários negociando móveis, ela cogitava fazer empadas, pásteis de forno e tortas salgadas para festas, mas ali onde morava, era desconhecida, demoraria muito até fazer freguesia...
Tudo era complicado para eles, naquele momento.
Ele pensou em levá-la para morar com sua família num bairro do Rio, ali não precisariam pagar aluguel, e consequentemente a vida deles voltaria ao normal, como no início...
Mas seria muito ruim para ela e a filha, porque deixariam de ter as suas próprias coisas, para utilizar dos outros, pois não poderiam levar seus móveis, teriam de vender tudo e levar apenas o necessário.
Além disso, morar com família de marido, é briga na certa! Sem falar, que elas se sentiriam estranhas, numa casa onde antes, nunca tinham colocado os pés...Não, essa não era a melhor opção! Ficariam então onde estavam e continuariam tentando melhorar de vida. Todos sofrem os efeitos da recessão, os dias estão difíceis, repetia Dóris para si mesma.
Mesmo com o aumento dos pensionistas, de nada adiantava para Dóris, devido as suas despesas que aumentaram desde que mudaram para outra casa.Mas teve de ser assim, porque o antigo senhorio pediu a casa. Eles teriam que se virar em 2 meses para achar outra e mudar. Procuraram todos os dias em imobiliárias, por telefone, fazendo longas caminhadas, visitando as que estavam com as placas de aluguel, mas nada servia: Eram bem mais caras, ou tinham vazamentos, ou ainda, estavam em local perigoso, etc...
Apenas essa que optaram, cabia ficar. A construção era semi nova, apenas um inquilino estivera ali antes, por 6 meses. Teoricamente estava tudo ok... teoricamente...

Mal entraram, o trinco da porta da sala quebrou, a caixinha de descarga também, a torneira da cozinha por 2 vezes quebrou, e uma torneira em um dos tanques da área, teve quer ser colocada para que ela enfim pudesse colocar sua máquina de lavar para funcionar. A água acabou e não tinham bomba d´água, falaram com o dono e ele providenciou, mas para que eles pagassem por ela depois... A bomba levava 5 h para encher a caixa de 1.000l, gastando uma luz absurda! Mais despesas inesperadas...
Sem falar que 2 meses depois, essa mesma caixa, rompeu e começou a cair água pela laje da cozinha, pela lâmpada...Dóris e Heitor passaram a noite despejando as bacias d´água...
No dia seguinte, depois de Dóris ir até a casa do dono e informar o acontecido, ele providenciou uma nova caixa desta vez de 500l.E enviou um de seus serventes de obra, para destelhar a casa, trocando as caixas, e nisso, quase 3 dias de sufoco, no total...

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Sem falar num episódio que ocorreu no dia de ano novo:
Dóris e Heitor dormiram cedo, afinal apenas eles estavam na casa:
A filha de Dóris, tinha ido passar as férias de dezembro, na casa dos parentes no Rio.
O casal então, passou tanto o Natal, quanto o ano novo, completamente sozinhos na nova casa.
Lá pelas 2:30h da madrugada, ainda se escutava fogos aqui e ali.
Mas isso não atrapalhava o sono deles, o que pertubou foi o que veio depois:
Batidas fortes no portão de madeira, que eles imaginaram atordoados pela sonolência, que fossem em outra casa. Ou talvez algum vizinho que veio dar "Feliz Ano Novo".
Se fosse esse o caso, eles manteriam tudo mesmo às escuras, para que percebessem que eles não estavam em casa, ou dormiam...
Queriam continuar a dormir, não era hora para visitas!Mas, alguém continuava a bater e gritar coisas incompreensíveis, finalmente conseguiram abrir o portão, de tanto empurrar...
Dóris estava nervosa, uma invasão! E se estivessem armados para um assalto?
Eram 3 homens, visivelmente embriagados.Heitor foi até eles, que já estavam dentro do quintal da casa, e disse:
_ Você, estão procurando quem? Entraram na casa errada.
Um deles perguntou se não era a casa do tal dono. Heitor disse que agora essa casa estava alugada para ele. Eles ficaram sem jeito, porque eram parentes do dono, queriam dormir na casa, mas não sabiam que agora estava alugda, pediram desculpas pelo incomôdo e foram embora.Dóris e Heitor viram como estavam vulneráveis ali, porque se fossem bandidos mesmo, teriam rendido aos dois. E se por acaso Dóris não tivesse Heitor como marido, ainda estivesse solteira? Imaginou como estaria indefesa, a filha estando no Rio e ela sem um homem ali, para cuidar dela...
Nossa! Era nesses momentos que agradecia por ter conhecido Heitor, ele a fazia se sentir segura e protegida. Mesmo ele sendo temperamental, ela contornava as situações, e se davam bem.Era isso que a família dela não gostava nele também, porque ele não media as coisas que dizia, saía assim... Até que no caso dos 3 homens ele tinha sido bem calmo, Dóris pensou:
" Deve ter sido o outro lado da personalidade dele, que o manteve calmo"...
Ele era o homem mais educado do mundo quando esse lado aparecia, mas poderia ser o extremo oposto, quando a outra personalidade surgia...
Dóris aprendeu a conviver com isso, todos temos nossos segredos da alma, uns demostram outros guardam dentro de si, e esses que são os piores!Quando essas pessoas ditas tranquilas emergem em fúria, podem se tornar perigosas...Melhor então ser como Heitor, mostrar o que é, quem gostar dele, ótimo, quem não gostar, paciência...

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CAP III

Dóris andava triste, o motivo era seus filhos. Uma decepção atrás da outra. No dia primeiro de janeiro, sabia que seu filho mais velho estaria na casa dos avós, seus pais.Tinha tempos que eles não se falavam, Dóris ligava para o celular, e nada! Nunca atendia.
Mas naquele dia, ele não teria como deixar de falar com ela. Dóris fez a chamada para casa de seus pais e sua irmã, Alexia atendeu.Depois de se falarem e desejar um bom ano, Dóris pediu para que ela chamasse seu filho. Alexia foi até o quarto onde ele estava conversando com algumas pessoas da família e disse que Dóris aguardava na linha.Os minutos se passavam...
Dóris sabia que a irmã devia estar falando com ele para atendê-la.Uma voz apareceu na linha:
_ Alô.
_ Filho, tudo bem com você, a Valeska e o Gui?
_ Tudo indo, mãe. E você?
_ Vou levando a vida. Sinto muitas saudades de vocês todos. Mas eu ligo e nunca atendem... Bem, sabe que continuo me preocupando com vocês, e o que eu mais queria, era saber que estava bem empregado para dar um futuro melhor para o Gui. Você entende que eu não podia mais te ajudar a pagar seu aluguel, porque eu mudei de casa e agora é muito maior o meu aluguel. Te enviei mensagem dizendo, você leu?
_ Li, mãe. Minha avó também falou.
_ Então como eu não posso ajudar financeiramente, eu rezo todos os dias por vocês, que não saem do meu pensamento. Até dói...
_ Tá, obrigado, mãe.
_ Filho, então vou ficando por aqui, te desejo um bom ano, saúde, um bom emprego, paz e alegrias. Não esqueça que eu te amo. Um beijo. Fica com Deus.
_ Pra você também, beijo.

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Dóris colocou o celular em cima da cama e ficou parada, olhando para o biombo que Heitor fizera para o quarto. Olhos fixos, mas mente atenta:Seu filho havia mudado com ela. Dois eram os motivos:Primeiro, por ter arrumado novo marido, e segundo por não mais ajudar a pagar o aluguel dele.
Pena... Ela passava dias a fio, preocupada com ele e a verdade lhe doeu até a alma.

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Não bastasse a filha do meio, Ivy, não frequentar mais sua casa, nem levar a pequena Bianca para visitá-la, mais uma decepção dessas...Em sua companhia, ainda estava Tifany a caçula.Dóris sabia que quando ela se tornasse adulta, também sairia de casa. Esse também era um dos motivos para não ficar só. Ainda bem que tinha Heitor! Ele lhe faria companhia durante os próximos anos...
Mas a adolescência de Tifany não era nada fácil para Dóris. Ela fazia com que os problemas de Dóris se tornassem ainda maiores!Já apresentava sinais disso, desde os 10 anos de idade. O pai de Tifany, na época ainda vivo, certo dia disse a Dóris:
_ Tenho pena de você. Estou doente tem tempo, qualquer hora já me vou. Mas você vai ficar e conviver com ela desse jeito, vai ser bem difícil!
_ Eu sei...
Dóris pensou por um momento, como seria bom que se os filhos parassem de crescer aos seis anos, ficassem todos com essa idade. Tifany era um anjinho aos 6 anos:
Compreensiva, amiga, carinhosa... Agora, era exatamente o contrário!
A adolescência de Tifany, trouxe problemas para Dóris que ela não tivera com os outros dois filhos mais velhos: Tifany era deprimida, podia ficar dias sem falar com ninguém, tinha crises de choro na escola, dificuldades de se relacionar com as colegas, ao mesmo tempo, poderia ser agressiva com as palavras...
Desenvolvera também uma tendência para a anorexia, comendo pouco. Isso é que deixava Dóris mais preocupada ainda! Se ela ficasse fraca, anêmica, todos que não soubessem o drama que Dóris passava com ela, diriam que ela estava sem querer comer porque a mãe tinha arrumado um marido novo. O que não era a verdade!
Ela estava assim porque a 'modinha" da escola era ser magra. E algumas meninas do colégio já haviam desmaiado por fraqueza... Dóris estava já pensando em ir até a escola, pedir a diretora que convocasse uma reunião extra, para falar do assunto com as mães.

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CONTINUA
Fátima Abreu

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